A direita portuguesa sempre teve dificuldade em aceitar que a "nossa" ditadura foi tão "ditadura" como as dos outros. A nossa até se compreende, não foi tudo mau. Não se pode demonizar. Já 50 anos de ditaduras comunistas: mau, diabólico. De um lado agentes do bem guiados pela luz que emana do Vaticano, do outro acólitos do culto da morte promovido por Moscovo. Simples.
A nossa ditadurazinha, enfim, coisa pouca, desagradavelzinha, mas não há que demonizar, não há que descrever uma ditadura brutal "com bons de um lado e vilões do outro, como nos filmes manhosos, há sempre quem prefira ficar do lado do bandido. É diferente".
E sim, o Álvaro Cunhal e o PC são heróis no contexto da luta contra a ditadura. Sim, a ditadura é má, é diabólica. Houve coisas boas? Houve. A Ponte 25 de Abril foi construída durante a ditadura. A autoestrada Varsóvia-Cracóvia também, mas não é por isso que eu acho a versão polaca do estalinismo menos criminosa. Porque é que é tão difícil para a direita demarcar-se categoricamente de uma ditadura? No ifs, no buts.
Desculpem lá se a ditadura portuguesa foi de direita.
Desculpem lá se a oposição (na sua grande maioria) foi de esquerda.
Desculpem lá se o PC teve um papel fundamental na luta contra a ditadura.
Desculpem lá se nem toda a gente meteu a cabeça na areia entre 1926 e 1974. Desculpem lá se eu me orgulho da democracia que temos e do país que a construiu.
A direita, que fala de valores, de não fazer concessões em relação aos 'core-values' da nossa civilização. A direita que ainda não tem a certeza se "nós" merecemos a democracia, baseando-se na tese antropologicamente sofisticada de que "somos malandros, somos mesquinhos, somos medíocres, temos inveja, gostamos do respeitinho e de violar as regras pela surra. Somos o que de pior há em nós e que nos fez fazer o que fizemos. É pena, mas o Estado Novo fomos nós."
Fala por ti, pá! Prefiro concentrar a minha energia a admirar os que se opuseram, em vez de arranjar desculpas para os que executaram ordens! Como prefiro admirar os que durante o século XVI achavam que talvez não fosse boa ideia massacrar os povos que decobríamos, a endeusar aqueles que o faziam em nome da glória,da fé e do império; como prefiro admirar o católico alemão que acaba no campo de concentração, do que o comunista que acaba por votar Hitler num dos plebiscitos.
Talvez seja essa a diferença entre nós: alguns, sob a cobertura do pessimismo antropológico dizem que "enfim, somos mauzinhos, contentem-se com o que têm - olhem para a Espanha e para o Franco, podia ter sido pior". Os outros preferem elevar a fasquia e não aceitam que há coisas que os escandinavos merecem mas nós não.
E é por isso que a direita portuguesa está tão desconfortável com o passado e com a ditadura: é que somos uma democracia apesar deles e não por causa deles. E isso deve doer.
E para a próxima vez que ouvirem instituições como o Parlamento Europeu a discutir ditaduras e violações dos mais fundamentais direitos humanos, acompanhados de um tom gozão sobre a mediocridade que sustenta esses regimes, não se esqueçam que há 30 anos andava tudo a gozar com Portugal e com esse regime que "enfim, não se deve demonizar".
E não se esqueçam, para a próxima vez que quiserem invadir um país como o Iraque para lhes trazer a boa nova da democracia, pensem bem se eles não são "malandros", "mesquinhos", "medíocres", se não têm "inveja", se não "gostam do respeitinho e de violar as regras pela surra" e se, tal como "o Estado Novo fomos nós", o "Saddam não foram eles."
Basicamente a mensagem é esta: nós valemos tão pouco que nem um gajo que combate a ditadura tem mérito. Somos todos iguais. Aristides, Salazar, Cunhal, não passamos de uns pingos num mar de mediocridade. Why make an effort? Why care?
Sorry, I care.
segunda-feira, março 26, 2007
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2 comentários:
you care??... Don't think so!!
E já agora, se o Nacionalismo é uma porcaria (lembrando lhe que apoia o gato fedorento) preocupa-se com que mesmo? Com Portugal nao deve ser certo?
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