Como já referi aqui, aqui e aqui, o anti-semitismo em Portugal está omnipresente. Assim mesmo: omnipresente.
Vão por favor ver à secção P2 do Público de hoje. Um artigo sobre "Queijo da Serra", que explica como na Beira se voltou a fazer queijo kasher (isto é, preparado de acordo com os preceitos higiénicos e rituais previstos pela religião judaica). Uma boa oportunidade para reflectir sobre a presença do judaísmo em Portugal, ou para destruir mitos e preconceitos? Não, para isso não se podia ter incumbido da tarefa um "jornalista" do Público.
A páginas tantas, o "jornalista" explica as motivações de um tal de José Agostinho Braz (especula-se no artigo sobre as suas origens cristãs-novas) para produzir queijo da serra kasher no meio da Beira Alta.
"...aquilo que em Israel é visto como o apelo das origens ou a procura do reencontro com as suas raízes ancestrais, para José Braz parece ter surgido apenas como uma oportunidade de incremento da facturação. Será essa, porventura, a mais firme revelação da sua costela judaica, mas a ideia central era, de facto, a expansão do negócio. "
Depois vêm umas considerações totalmente descabidas sobre "religiões semitas", que nem vale a pena corrigir.
Mas enfim, aparentemente a vontade de alguém querer fazer dinheiro é um indicador de uma "costela judaica".
Não, Daniel, a islamofobia não é o anti-semitismo do século XXI. O anti-semitismo ainda é o anti-semitismo do século XXI.
Adenda: depois de mostrar esta passagem a alguém, fiquei com menos certezas sobre o que escrevi. A que é que se refere a palavra "essa"? Ao "apelo das origens" e à "procura do reencontro com as suas raízes ancestrais"? Ou à "oportunidade de incremento de facturação"? Confesso que lendo com atenção fico com dúvidas... Vale a pena ler o artigo para perceber bem o contexto.
terça-feira, março 03, 2009
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8 comentários:
Está bem, mio caro, não há maior anti-semitismo que o semita prepotente contra Gaza e a Cisjordânia, i.é. Palestina.
Betzalel, Jerusalém
Está realmente entranhado na sociedade portuguesa a criaturização de um humano cuja religião é o judaísmo.
Já ouvi tantas vezes portugueses dizerem que em Portugal não há xenofobia nem racismo, talvez um pouco de bairrismo - ora que é necessário fazer boa figura nas marchas populares, ora que o apego à freguesia é grande porque já os avós são de lá. Mas ainda estou para perceber o que significa "vai para a tua terra, 'oblá!" quando se discute futebol, quando alguém se muda de uma outra zona do país para outra, quando alguém faz comparação entre a cidade em que é acolhido e aquela de onde vem.
Em comparação com outros, é referido que o nosso país é uma unidade territorial coesa: só há uma única língua, a religião e a origem são as mesmas. O folclore e a gastronomia não interferem na identificação nacional - dançar o vira ou cantar fado, comer broas castelares ou aletria no Natal, não faz uma pessoa diferente das outras. Talvez nem sequer goste de coisas tradicionais ou de doces. O que é certo, é que estas pessoas fazem parte de uma maioria - a maioria!
Eu, como judeu, não me encaixo nessas tradições. Celebro coisas diferentes e tenho outros valores, tenho uma outra forma de ver as coisas e desejos diferentes. Como religioso, destaco-me ainda mais porque sou facilmente identificável. Percebo que as pessoas olhem porque não estão habituadas... talvez saibam que vai ali um judeu ou não. Mas não percebo os risinhos ou o apontar de dedos ou fazerem comentários (pensando que não entendo a língua) quando estou no metro e leio em hebraico.
Medo de judeus? Acham que os judeus são muito maus, feios (não mesmo - então venham a Israel), e de nariz grande (também há pequenos e achatados...), perigosos e... - é fácil perceber que nunca conheceram um judeu na vida. Ok, dois - para o caso do primeiro não ser simpático. Quando se conhece um tudo o que ele diz, ou faz, torna-se uma sinédoque.
Por isso, quem não tem uma forma de vida como os da maioria podem realmente ter a noção se há ou não fobia. Parece-me que há. Nas minhas experiências isso aconteceu com aqueles que na relação tinham mais poder - professores e funcionário do Estado Português que me impediu de exercer o direito de ter passaporte por não tirar "isso (kipá) já da cabeça". Claro que as questões foram desbloqueadas mostrando quão ridícula a pessoa está a ser (da forma mais cordial e educada) - também designado por "chamar à realidade/razão" - e referindo situações legais consagradas (o que é muito triste quando isso acontecer porque estamos a defender a nossa existência: a legal e a todos os níveis básicos) e não têm resposta para tal - claro.
O meu rabino costumava dizer há muitos anos que Portugal não tem identidade, que foi perdida em determinado momento - mas como não era português talvez tenha uma visão mais imparcial.
Falta aos portugueses contacto com realidades que não só a sua - viajar para um país e ficar lá algum tempo traz bons frutos. A experiência, depois do regresso, é duradoura - com certeza mais do que a assistir a um jogo de futebol na bancada ou uma ida ao cinema (embora estas experiências possam também ser boas e distanciar um pouco os problemas).
Terminar o secundário aos 17 anos é prioridade - é mal visto a reprovação e, mais do que ser estigmatizado de burro, é PERDER um ano. Quem não ingressa logo na faculdade para gozar um ano de experiências (mudando de país ou apenas de região) é tolinho. O que importa é estudar, trabalhar e parece-me que tudo se resume a isto.
Então, o nível do jornalismo reflecte, realmente, o nível de uma sociedade. O mundo e a realidade não cabem todo
numa letra, pixel, ou decibel. Mas a ignorância e qualquer opinião sim.
Parece-me que falta também aos portugueses amor uns pelos outros. Só nas desgraças!
Simon
Bastante revelador, o seu comentário. Não vale a pena tentar explicar-lhe que o conflito israelo-árabe não tem nada a ver com anti-semitismo. Trata-se de um conflito político e sobre terra. Mas eu percebo que o que importa é misturar tudo e banalizar a acusação de anti-semitismo, para depois não levar a sério o verdadeiro anti-semitismo.
O que é evidente no texto que o David coloca é a banalidade com que se recorre a lugares-comuns e o pouco que se percebe do que é diferente. Se isso é um sinal d euma xenofobia portuguesa ou não, sinceramente não sei. Que é sinal de ignorância, não tenho dúvida. E prova de péssimo português. Tão mau que as dúvidas do David são irremediáveis. Pelo contrário, a disponibilidade do David para repensar o post, para ter dúvidas, é a prova do inverso.
HB
Parabéns aos republicanos (?) portugueses. O barrete frígio fica-lhes muito bem e se colocarem uma estrelinha do BE, melhor ainda. Não há dúvida: existe mesmo o tal cordão umbilical com o nacional-socialismo. Coisas de vermelhos...
Nuno
tanta sabedoria em tão poucas linhas. Vê-se que o Nuno é um verdadeiro conhecedor das motivações políticas e das inclinações ideológicas dos participantes neste blog. Aparece cada um...
O antisemitismo é, em geral, cristão, e, em particular, católico.
Em Portugal, um dos filhos dilectos da Santa Inquisição, continua bem e recomenda-se.
É só afagarem-lhe o pêlo e dirigirem-lhe um ou dois incitamentos, para tudo reemergir.
E nem se pense que é apanágio desta ou daquela área ideológica (?)deste ou daquele extracto social.
Percorre transversalmente a sociedade civil, estando igualmente latente em culturas de interioridade como em áreas profissionais onde seria suposto campearem a cultura histórica e o apego à objectividade dos factos.
E, deixem-me que vos diga, tudo isto se acentuou, reflectindo-se no plano da vivência urbana e cosmopolita, com a chegada maciça "à cidade", nas últimas décadas,daqueles que Agustina Bessa Luís designa pelos "novos lutadores".
Haja Israel
Nostradamus
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