terça-feira, março 27, 2007

Sobre os outros Valores

Acredito nos únicos valores fundamentais absolutos da Liberdade, Igualdade e Fraternidade que nos guiam, e que nos pariram dolorosamente para a modernidade. Acredito nestes tanto como desconfio da infusão ou mera referência a outros valores menores, como o Cristianismo, a Segurança ou a Virtude em qualquer texto fundamental da Europa ou qualquer Lei ou protocolo de Estado.

A Segurança é actualmente o ataque mais resiliente aos valores fundamentais da Liberdade e sobre este tema não me apetece dizer nada porque ainda estou à espera de ver onde vamos parar.

O Cristianismo e o Judaísmo são um lastro necessário para a nossa identidade “judaico-cristã”, mas é necessário compreender que todos os avanços significativos da Europa foram feitos muito mais “apesar de” do que com o seu contributo. A Igreja pactuou sempre com o establishment (Monarquias absolutistas e regimes ditatoriais) e tem de compreender que deve a modernidade a movimentos de cisão na Igreja ou mesmo contra a Igreja que procuraram a Igualdade

A Virtude não é essencial à vida e é para mim, como a dignidade para Jorge de Sena, apenas a “alegria de estar-se vivo, sabendo que ao mesmo tempo ninguém está menos vivo, ou sofre ou morre, para que um de só nós sobreviva um pouco mais à Morte, que é de todos e virá”. Contraponho à Virtude o exercício da Fraternidade.

Não sou um relativista porque tenho como valores absolutos os valores da Revolução e da Republica. Sou d’Ela a recorrente figura, por vezes primária e grotesca, que se eleva para a louvar. Sou filho de Danton (e neto de Epicuro) e vim ao mundo pelo mamilo esquerdo da “Liberdade guiando o povo” e bebendo apenas das minhas sensações.

Cabe-me também comunicar-vos que Deus não existe, descobri-o há pouco tempo. Eu que nunca fui “mendigo de vagos deuses ou de anjos obscuros” tenho agora a certeza que tudo isto acaba aqui e ficará pouco, muito pouco, mas algo ficará sempre (porque de tudo resta um pouco). Deus não existe porque não intervém, não promove a Liberdade, nem a Igualdade, nem a Fraternidade e não só não escreve por linhas tortas como não escreve absolutamente nada.

Todos são meus Irmãos sejam eles de que religião forem, sejam Virtuosos ou Alarves, Monárquicos ou Republicanos. Reconcilio-me com o Mundo após uma excelente refeição, uma boa garrafa de vinho, um JB de 15 anos e sensação inigualável da certeza dos que Amo. Só não me reconcilio hoje com a imagem do deus pai e omnipotente, porque essa é a imagem mais absurda que pode ser dada a alguém que, em espaços brevemente saudáveis, realmente olhe ou sinta a aleatoriedade estúpida da Natureza.

1 comentário:

Anónimo disse...

Tenho no meu circulo próximo alguns Incondicionais. Afortunado! Não meus. Antes eu, deles. Para onde forem, eu vou. O que não deixa de ser Bizarro, para um egoísta crónico.

Há uns anos atrás tinha uma visão desencantada da Vida. Perguntava-me o que seria de mim quando se derretesse o gelo no fundo do copo. Fosse de JB 15 anos ou de outro qualquer. Não era importante.

Hoje tenho a mesma visão desencantada. Nada mudou. Lido apenas melhor com isso. Desapareceu talvez a noção arrogante de oráculo privilegiado.Talvez com alguma pena. O que é bom sinal: uma réstia de arrogância!

Enfim.

A Virtude não é essencial à Vida. Julgo que a minha saudosa Avó Cristina concordaria com isso, apesar de (mais um apesar de) ser devota de N.Sra., com quem conversava longamente todas as noites antes de se deitar.

Sejamos poetas do vinho como Omar Kayam! Bebamos, comamos, e desfrutemos dos prazeres mais mundanos! Mais ou menos incondicionais. Saibamos fazê-lo!

E, depois, deixai-me humedecer os olhos, só, em momentos de lucidez.