Marques Mendes defende que a resposta certa no referendo de dia 11 é votar Não e a seguir propor na Assembleia da República a despenalização tout-court da interrupção voluntária da gravidez, para o que se disponibiliza a assumir esse compromisso.
Está em causa fazer o que seria aceite caso o Sim ganhasse mas a pergunta colocada não tivesse a fatídica segunda parte - em estabelecimento de saúde legalmente autorizado, a pedido da mulher - e que, segundo os adeptos do Não, implica uma verdadeira liberalização do aborto. É essa a argumentação que Marcelo Rebelo de Sousa tem propagado.
Dizer que está em causa uma liberalização e não uma despenalização tornou-se, aliás, o soundbyte preferido dos defensores do Não nesta campanha. É a todos os títulos notável e recomendável o sketch do Gato Fedorento sobre a argumentação de Marcelo Rebelo de Sousa.
Façamos, então, um exercício de simulação na aplicação da lei.
Suponhamos que ganha o Não.
Marques Mendes propõe na Assembleia da República a despenalização da IVG a pedido da mulher até às 10 semanas e a esquerda aceita. Uma clínica privada passa a incluir nos serviços que presta a realização de abortos. A mulher que aí se dirige pode realizar um aborto em condições de higiene e segurança, mas como à própria clínica não interessa a realização de quaisquer diligências adicionais que se traduzam em aumento de despesa, a mulher aborta sem acompanhamento psicológico ou informação sobre a intervenção clínica a que se vai sujeitar, e que pode eventualmente contribuir para que a mulher decida não abortar e prosseguir com a gravidez. Tal acompanhamento não existe porque a lei não impôs a um tal estabelecimento de saúde a necessidade de observar qualquer procedimento profiláctico e informativo. É isto desejável?
Mas o exemplo pode ir ao absurdo: o que impede alguém com conhecimentos mínimos de obstetrícia adquiridos sabe-se lá de que forma, de abrir um escritório anunciando à porta: «Aqui fazem-se abortos»?
A proposta de Marques Mendes hoje avançada tem apenas o mérito de acabar com uma certa ideia de aborto clandestino, que passa a ser feito às claras, mas não garante à mulher qualquer tipo de acompanhamento, porque tudo é feito de acordo com a conveniência de quem presta o serviço - é ou não é essa a verdadeira essência da noção de liberalização?
Dir-me-ão que tal não sucederá porque o deputado Marques Mendes cuidará de especificar na sua proposta que só a mulher é despenalizada, não quem a assiste. Mas aí voltamos à vaca fria, e o problema do aborto clandestino persiste.
Está em causa fazer o que seria aceite caso o Sim ganhasse mas a pergunta colocada não tivesse a fatídica segunda parte - em estabelecimento de saúde legalmente autorizado, a pedido da mulher - e que, segundo os adeptos do Não, implica uma verdadeira liberalização do aborto. É essa a argumentação que Marcelo Rebelo de Sousa tem propagado.
Dizer que está em causa uma liberalização e não uma despenalização tornou-se, aliás, o soundbyte preferido dos defensores do Não nesta campanha. É a todos os títulos notável e recomendável o sketch do Gato Fedorento sobre a argumentação de Marcelo Rebelo de Sousa.
Façamos, então, um exercício de simulação na aplicação da lei.
Suponhamos que ganha o Não.
Marques Mendes propõe na Assembleia da República a despenalização da IVG a pedido da mulher até às 10 semanas e a esquerda aceita. Uma clínica privada passa a incluir nos serviços que presta a realização de abortos. A mulher que aí se dirige pode realizar um aborto em condições de higiene e segurança, mas como à própria clínica não interessa a realização de quaisquer diligências adicionais que se traduzam em aumento de despesa, a mulher aborta sem acompanhamento psicológico ou informação sobre a intervenção clínica a que se vai sujeitar, e que pode eventualmente contribuir para que a mulher decida não abortar e prosseguir com a gravidez. Tal acompanhamento não existe porque a lei não impôs a um tal estabelecimento de saúde a necessidade de observar qualquer procedimento profiláctico e informativo. É isto desejável?
Mas o exemplo pode ir ao absurdo: o que impede alguém com conhecimentos mínimos de obstetrícia adquiridos sabe-se lá de que forma, de abrir um escritório anunciando à porta: «Aqui fazem-se abortos»?
A proposta de Marques Mendes hoje avançada tem apenas o mérito de acabar com uma certa ideia de aborto clandestino, que passa a ser feito às claras, mas não garante à mulher qualquer tipo de acompanhamento, porque tudo é feito de acordo com a conveniência de quem presta o serviço - é ou não é essa a verdadeira essência da noção de liberalização?
Dir-me-ão que tal não sucederá porque o deputado Marques Mendes cuidará de especificar na sua proposta que só a mulher é despenalizada, não quem a assiste. Mas aí voltamos à vaca fria, e o problema do aborto clandestino persiste.
1 comentário:
Subscrevo o teu post.
Abraço
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