Miguel Sousa Tavares exprime hoje no Público (versão online apenas disponível mediante subscrição) o seu desagrado em relação a uma dita "teoria do primado absoluto do "direito à orientação sexual" que está a tornar-se uma espécie de ditadura bem-pensante, que funciona por um método "terrorista" de silenciamento dos discordantes", referindo-se expressamente ao caso das duas alunas "de 14 ou 15 anos" que foram repreendidas pelo conselho directivo da sua escola, em Gaia (conforme, aliás, referimos na Boina em post anterior).
Cumpre referir em primeiro lugar, que Sousa Tavares incorre em diversos erros factuais na sua análise do caso de Vila Nova de Gaia. As alunas em causa não têm 14 ou 15 anos, antes são jovens de 17 e 18 anos. Acresce ainda que não se verificou qualquer fenómeno de "exibicionismo" por parte das alunas, sublinhando os respectivos colegas a discrição que ambas sempre adoptaram nos seus comportamentos públicos. De facto, o que verdadeiramente está em causa é uma questão de igualdade de tratamento em relação a colegas heterossexuais, aos quais nunca foi transmitida qualquer proibição de idêntica troca de afectos em público.
Contudo, há dois aspectos da crónica de Miguel Sousa Tavares que me parecem particularemente graves.
Sousa Tavares afirma que os colegas não têm de ser "expostos a manifestações públicas de tais "afectos". Para além de não perceber porque é que uma manifestação de afectos de um casal homossexual tem de ser aludida entre aspas, também não consigo alcançar porque é que os colegas hetrossexuais não podem ser expostos a afectos homossexuais, mas já não há qualquer problema em submeter um aluno homossexual a manifestações de afecto heterossexual. O caminho perigoso para onde nos remete uma argumentação assente nesta dualidade de critérios é o da menor protecção jurídica para os casais homossexuais.
Por outro lado, a forma como o autor alude ao direito à orientação sexual, referindo-se-lhe, mais uma vez, entre aspas, parece siginificar um não reconhecimento da qualidade de direito pleno. Sublinhe-se que quanto a este aspecto não subsistem dúvidas: a orientação sexual é uma manifestação evidente do direito ao livre desenvolvimento da personalidade (n.º 1 do artigo 26.º da Constituição) e está expressamente inscrita, no quadro do princípio da igualdade (artigo 13º da Constituição), a proibição de discriminação em função da orientação sexual.
Finalmente, apesar de invocar, e com merecida razão, as anteriores posições públicas que assumiu em favor do casamento entre pessoas do mesmo sexo como forma de demonstrar a sua recusa de qualquer sentimento homofóbico ou de menor abertura a esta temática, ao associar expressamente homossexualidade a exibicionismo, marcando-o como característica negativa de determinada orientação sexual, Miguel Sousa Tavares não consegue evitar a queda para o preconceito.
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