O Diário de Notícias titula um artigo com a seguinte frase: "Portuguesas ganham mais na função pública". Logo de seguida, a primeira frase do artigo já explicita que, "em média", as mulheres empregadas na função pública ganham mais do que os homens". Uns parágrafos adiante, a notícia evolui para o seguinte: "Mas será mesmo assim?, questiona o leitor mais céptico. Bem, o assunto merece esclarecimentos adicionais. É que as mulheres ganham mais porque têm melhores qualificações, que exigem, naturalmente, remunerações superiores."
Parece-me que estamos perante uma abordagem pouco rigorosa e enganadora na forma de titular e destacar a notícia, transmitindo uma mensagem que não corresponde à realidade que consta do corpo do texto informativo. A matéria da desigualdade de remunerações entre homens e mulheres coloca-se, obviamente, nos casos em que, para idênticas funções e qualificações, existam discrepâncias remuneratórias. É neste contexto, que recentemente foi identificado um pay-gap de 15% entre homens e mulheres, na média dos países da UE (Portugal até se fica pela casa dos 4%). O que a notícia do DN aponta é para a existência de mulheres mais qualificadas que os homens na função pública - não há aqui uma questão de desigualdade, uma vez que não estamos perante pessoas com idênticas qualificações. As mulheres não são mais bem remuneradas que os homens em idênticas funções e com idênticas qualificações.
Verdadeiramente, aquilo que não há na função pública e é positivo é o referido pay-gap, uma vez que a transparência da contratação, a vinculação ao princípio da igualdade e a existência de tabelas salariais relativas às carreiras e insusceptíveis de variação casuística em função do género a tal obsta. Numa nota final sobre o assunto, este último aspecto é de reter na reforma do sistema de vínculos na função pública - o abandono tendencial do vínculo por nomeação, através do modelo clássico de carreiras, para algumas funções, não pode desaguar num regime de contrato de trabalho cuja maior flexibilidade remuneratória possa expôr a Administração Pública a uma realidade a que, felizmente, é hoje alheia.
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